Sistema Universitário: bota na conta do Papa!

Quem se dedica a estudar um pouquinho sobre a Idade Média, inevitavelmente sofrerá a angustiante sensação de pane mental. Quando você sai da Matrix, é tamanha a quantidade de informações que contradizem o senso comum, que o cérebro quase funde.

“Uaaai… então a Igreja nunca pregou que a terra era plana?”; “Ôxi! Foram os monges que preservaram os textos gregos?”; “Véi, como é que aqueles medievais bitolados puderam criar o sistema universitário?”… Este é justamente o centro da questão: uma Igreja repressora e inimiga do pensamento poderia ter gerado uma instituição voltada para o cultivo sistemático do saber, em diversas áreas do conhecimento?

Os papas criaram, financiaram e garantiram a autonomia das universidades

As escolas mantidas pela Igreja Católica nas catedrais foram a semente da criação das universidades, por volta de 1150. Grande parte das universidades medievais ainda subsiste na Europa, e continuam a ser das mais famosas do mundo inteiro: Oxford, Cambridge, Paris, Bolonha, Coimbra

Os papas foram os grandes incentivadores, financiadores e protetores das universidades. Eram eles – pasmem! – que garantiam a sua autonomia em relação à influência dos governantes e bispos, possibilitando que fixassem livremente suas próprias regras, cursos e estudos.

Tem muita gente tolinha (ou mal intencionada mesmo) que diz: “Ah, mas as universidades medievais eram dominadas pelo clero, e os estudiosos não tinham autonomia intelectual em relação à teologia”. Mas a verdade é que as pesquisas relacionadas aos fenômenos da natureza ficavam à margem da teologia. Veja o que diz o respeitado historiador Edward Grant: “exigia-se dos filósofos naturais das faculdades de artes que se abstivessem de introduzir teologia e temas de fé na filosofia natural” (1). Outro historiador renomado, David Lindberg, também concorda:

“…dentro desse sistema de educação medieval havia uma grande quantidade de liberdade. O estereótipo da Idade Média do professor covarde e subserviente, um escravo seguindo Aristóteles e os pais da Igreja (…), com medo de sair de linha que demandavam as autoridades. Haviam limitações teológicas, é claro, mas dentro desses limites os mestres medievais tinham uma notável liberdade de pensamento e expressão.” (2)

Uso da lógica caracterizava o método escolástico

Nas universidades medievais, a discussão exaustiva de uma questão, após considerar os argumentos contrários e a opinião dos grandes autores (autoridade), era a forma tida como a mais eficiente para se chegar à verdade. A rotina acadêmica dos estudantes era animada por debates fervorosos entre os graduandos, bem como o enfrentamento de mestres com pontos de vista opostos.

No site “Brasil Escola”, um artigo afirma que nos debates promovidos nas universidades medievais “ninguém questionava o que os grandes autores diziam. É por isso que, séculos mais tarde, a escolástica foi considerada uma forma de estudo dogmática (bitolada).” Ora, parece que o autor desta pérola confundiu as universidades medievais com as atuais, onde o discurso marxista reina absoluto, e são raras as vozes dissonantes. Reparem na contradição flagrante: se os universitários medievais não questionava nada, como poderiam haver tantos debates?! Vamos imaginar a cena:

– Eu acho que o céu é azul, porque o Aristóteles falou.

– Com todo o respeito, ilustre colega, eu discordo! Na verdade ele é… azulado!

Aff… Dá mesmo pra crer que era possível ser assim? Mi poupi!

O fundador da ilustre faculdade de Sorbonne (Paris), Robert de Sorbon, dizia que o amor ao debate, o apreço pelo espírito crítico e a dúvida metódica que caracterizam a cultura ocidental se devem justamente à sofisticação intelectual das universidades medievais (2). O historiador Edward Grant ratifica esta tese:

“O que fez possível para a Civilização Ocidental desenvolver a ciência e os estudos humanos de uma maneira pela qual nenhuma civilização tinha feito antes? A resposta, eu estou convencido, está em um penetrante e profundo espírito de questionamento que foi uma consequência natural na ênfase dada à razão que começou na Idade Média. Com exceção das verdades reveladas, a razão foi entronada como o último árbitro para a maioria das discussões e controvérsias.” (1)

(1) Edward Grant, God and Reason in the Middle Ages (2001)

(2) David Lindberg , The Beginnings of Western Science (1992)

*****

Se você quer saber mais, recomendamos a leitura do livro Como a Igreja Católica construiu a civilização ocidental, de Thomas Woods Jr. – Editora Quadrante.

 

Fonte: O Catequista (http://ocatequista.com.br/)

Sobre Alex C. Vasconcelos

Casado, 32 anos, pai de uma princesa, Advogado, Acólito na Paróquia do Divino Espírito Santo em Maceió/AL.
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